Navegando pelos desafios da mídia tradicional: growth mindset, mensuração e jornada do consumidor
A evolução de uma estratégia de mídia 100% focada em performance para outra com ampliação do mix e olhar para todo funil não é trivial, mas pode ser superada com esses passos
Por Renato Mendes
O CMO da XYZ está preocupado. O CAC (custo de aquisição) da sua startup cresce há quatro meses consecutivos e ele sabe que sua estratégia de mídia de performance exclusivamente focada em fundo de funil via compra de Google e Meta começa a se esgotar (tratamos deste tema e de suas possíveis soluções em um artigo anterior). Ele já entendeu que vai precisar ampliar seu mix de canais e começar a investir na chamada mídia tradicional para oxigenar sua lógica de aquisição e gerar novas safras de clientes, mas tem três aspectos dessa virada que estão tirando seu sono:
1. Medo de errar - Investimentos em algumas dessas mídias custam caro. O pacote de TV aberta que seu CEO pediu para ele cotar consumiria quase 30% do seu budget anual de marketing. É muita coisa. E se isso não trouxer os efeitos desejados?
2. Tempo de resposta - Diferentemente do que ele está acostumado com Links Patrocinados ou Instagram, por exemplo, alguns desses canais não trarão respostas imediatas. Ajudarão a tornar seu produto mais conhecido e terão efeito de médio e longo prazo, mas ele não sabe ao certo quando - e como - isso será percebido nos seus KPIs.
3. Mensuração complexa - Por fim, a entrada de novos canais, em sua maioria OFF, irá complicar a já difícil atribuição de canais e ele teme não saber avaliar se os novos investimentos trouxeram resultados ou não. Isso seria pior que errar.
Se você se viu em algum dos pontos acima, seja bem vindo ao clube. Apesar de necessária, a ampliação do mix de mídia e alocação de verba de marketing nos chamados canais de mídia tradicionais como TV, rádio, OOH e impresso é bastante desafiadora! E o CMO da nossa fictícia startup foi preciso em apontar os desafios centrais dessa virada.
Nosso objetivo com esse texto é o de te ajudar a encarar esse desafio, explorando possibilidades e caminhos. Começando do começo, o primeiro ponto a se ter em conta nessa história é o de usar sempre a lógica de experimentos. Testar pequeno, mensurar, aprender, corrigir a rota para depois buscar escala não é uma exclusividade do Growth, é um mindset da empresa.
*Teste pequeno e mantenha foco em performance*
É por isso que, pegando um exemplo da fictícia XYZ, alocar 30% do seu orçamento anual em um pacote de TV aberta que você não sabe se vai funcionar, não parece uma ideia plausível de largada. Você só controla os inputs mas, como nunca testou nada parecido, apenas pode imaginar o que vai sair do outro lado. E as dúvidas são muitas:
Será que as visitas ao meu site / ponto físico vão aumentar?
Qual a qualidade desse tráfego / taxa de conversão?
O momento do impacto com a mídia está relacionado com o momento da jornada de compra do meu consumidor?
Qual o percentual de clientes novos?
Passado o investimento meu awareness se mantém no novo patamar?
De novo, são várias as dúvidas de quem vai fazer um movimento como esse mas existe apenas UMA certeza: se eu pudesse testar antes com objetivo de minimizar meus riscos, eu faria. Assim como no casamento, aquele test drive antes, morando junto por uns anos nunca vai atrapalhar, apenas vai dar mais inputs para a tomada de uma decisão muito importante.
O mesmo vale, por exemplo, para a ideia de contratar uma celebridade como embaixadora de marca. Um contrato milionário, um período longo, uma trava cara de saída. Nenhum teste prévio. É tudo que eu não quero dado que, neste momento, meu foco está em aprender e não em buscar volume. Mas acontece muito. De novo, não faz sentido uma decisão assim na largada.
A segunda parte deste primeiro tópico da ampliação do mix passa por pela busca de canais com "cara de conversão". Tem dois deles que gosto particularmente. O primeiro é o chamado merchandise da TV aberta. O merchan acontece quando um apresentador anuncia certo produto preferencialmente dentro do contexto de um programa. Sim, vamos falar da Tekpix! Da perspectiva de marketing, o merchan combina a credibilidade de um apresentador, com o alcance da TV e um call to action claro (melhor ainda se puder ser com a urgência de uma janela de tempo). É o craque Neto vendendo camisa de futebol em programa esportivo ou a Cátia Fonseca falando de um produto incrível para sua cozinha em uma manhã durante a semana. Um investimento deste tipo é "barato" se comparado a qualquer outro formato amplamente conhecido da TV aberta e costuma trazer resposta rápida - seja ela positiva ou não.
A ideia aqui é menos do merchant em si e mais da forma de pensar. De novo, vamos retomar: investimento "baixo", CTA claro, tempo de resposta curto e foco em aprendizado. Dai para se tomar qualquer outra decisão, é bem mais fácil. Ampliação das inserções? Escolha de uma nova região? Aposta maior no mesmo canal? Outro produto? Podemos avançar em várias direções.
Outro modelo que é bastante interessante nessa lógica é o uso de micro influenciadores com remuneração pelo sucesso. Isso significa pagar apenas pela venda gerada. Imagine um exército de pessoas, focados em vender seu produto, com um orçamento que rapidamente pode ser ajustado de acordo com a performance e um modelo minimamente mensurável por cupom, por exemplo? É bem diferente de um grande orçamento, sem flexibilidade, sem nenhuma certeza de resultado que apresentamos ali atrás. Os micro ainda trazem a vantagem de saberem se comunicar com seu nicho e terem menos cara de publi.
Importante: Isso não substitui o papel de um(a) mega influenciadora, são papéis diferentes. Esta última traz a dinâmica de awareness de marca e credibilidade, tão importante quanto - mas aqui o foco é outro. Mesmo na contratação dessa grande embaixadora de marca, o ideal é experimentar antes, dentro do mindset que apresentei. A última coisa que quero é pagar milhões de reais, num contrato de longo prazo com uma celebridade e esperar vendas que nunca virão! Algumas vezes, o aprendizado está em entender que o papel dela no funil não será de conversão, por exemplo, será de construção de credibilidade. Para ficar num exemplo bem real.
*Mensuração e o papel dos canais/mídias*
Esse é exatamente o segundo aspecto que queremos abordar aqui. Entender o papel de cada canal e cada mídia na jornada do usuário é fundamental para se tomar uma decisão de alocação de investimento. Até então, o CMO da XYZ colocava 100% do seu investimento em formatos pagos de fundo de funil. Sua necessidade agora é desenhar uma abordagem que leve em conta todas as etapas do processo de compra do cliente, desde a conscientização até a lealdade. O objetivo é criar uma experiência coesa e atraente para o cliente, levando-o a avançar no funil de vendas da forma mais eficiente possível. Porque somente com uma abordagem completa pode ajudar sua empresa a obter um ROI (retorno sobre investimento) sustentável ao longo do tempo e isso é determinante para o sucesso..
Existem canais e formatos de mídia cujo papel é gerar conversão. Além dos já citados, existe, por exemplo, a mídia que fica dentro de elevadores. Ela pode ser usada por um restaurante, anunciando um prato específico e direcionando para restaurantes da região. O objetivo é gerar conversão nas próximas 2h e o KPI para medir sucesso desta campanha é o de vendas. É sempre interessante gerar um cupom ou um prato especial do dia com desconto para melhorar a qualidade dessa mensuração.
Outras iniciativas, no entanto, terão outros objetivos e, portanto, outros KPIs. Uma startup que conhecemos nos contou recentemente que fez um investimento de milhões para contratar uma celebridade global e o ponteiro de vendas não mexeu. Sim, milhões de reais investidos e nenhum retorno de vendas mensurado. Muita gente irritada. Quem, na sua opinião, é o culpado nessa história?
a. A celebridade que não foi capaz de gerar de vendas mesmo tendo milhões de seguidores
b. A startup que não entendeu qual era seu papel na jornada de compra
c. O Tite que não convocou… ah deixa para lá
Trazer uma celebridade da TV para usar seu alcance no digital talvez não traga vendas. Mas certamente traz awareness de marca entre milhares de pessoas que não conheciam sua marca. Traz credibilidade caso ela seja relevante para seu target. Pode gerar vendas ou não, só testes mais aprofundados poderão dizer mas o erro é não entender o papel de cada mídia em sua estratégia de aquisição. Nesse caso, a mensuração deveria ser em conhecimento da marca, por exemplo, e não em vendas.
A mensuração de uma estratégia multicanal, on e off, que permeia o funil como um todo vai sempre ser complexa. O ponto central, como já discutimos, é entender o papel de cada mídia e acompanhar sua performance de acordo com seu objetivo. Muitos founders usam o ROI para tudo, mas essa abordagem não faz sentido neste contexto mais amplo e complexo que estamos tratando. Para olhar last click, ok. Mas aqui, a conversa já subiu de nível.
*Entendendo a ocasião de compra*
Com a chegada de novas mídias e múltiplos pontos de contato entre consumidor e marca, o entendimento da jornada de compra tem se tornado cada vez mais desafiadora para as marcas. Além de tudo isso que falamos, existe ainda a dinâmica de cada categoria. Vender refrigerante não é a mesma coisa que vender um apartamento.
Nunca me esqueço de uma frase que ouvi do primeiro fundador de healthtech que conheci, lá nos idos de 2015: "Não vendo tênis Nike. Não é porque tem uma peça com desconto que o sujeito vai querer ir no Urologista". A mais pura verdade. Cada categoria tem sua dinâmica de consumo. Na dele, a mídia precisava criar awareness e gerar credibilidade para possivelmente ser considerada numa futura decisão de compra. Bem desafiador hein? Junte a isso o fato de que o budget era restrito (óbvio!). Ou seja, não podíamos só fazer awareness e esperar de braços cruzados que os leads caíssem nos nossos colos. Nosso desenho passou, entre outras coisas, por uma combinação de OOH próximos a locais de ocasião de consumo como consultórios médicos, dado que após a consulta, existe a necessidade de se fazer exames.
Entender a jornada no detalhe passa por entender, por exemplo, qual o ciclo de compra do primeiro contato com uma mídia de topo de funil com uma celebridade, por exemplo, até a conversão lá na ponta. No meio desse caminho, teve busca no Google para comparar com outros players, teve impacto pelo rádio, teve leitura de matérias a respeito da empresa na imprensa, teve consulta com amigos. Em uma startup que conhecemos, esse lead iria converter, na média, após 18 dias, com, no mínimo, três touchpoints com a marca via outros canais.
Cada mídia é desenhada com um papel específico dentro da abordagem de funil completa.
. Qual a mídia na sua estratégia tem o papel de fazer esse primeiro contato, garantir que você vai ser visto, quebrar a monotonia e se sobressair criativamente no meio de centenas de outras mensagens que brigam pela atenção de um cliente?
. Qual o canal que vai apresentar seus diferenciais, reforçando os benefícios de ser seu cliente?
. Quem vai atuar como sustentação durante essas conversas garantindo que você vai ser lembrado na hora certa?
. Como aproveitar esse primeiro contato para voltar a ativar os interessados?
*O pior erro*
Como vimos, a ampliação do mix de mídia é desafiadora mas necessária. Se você chegou até aqui, entendeu que existem três grandes pontos de reflexão:
. Para combater o medo de errar, testes pequenos, inicialmente em formatos que mais se aproximem da conversão, com foco em aprendizado para posterior aumento de volume;
. Para ajudar na mensuração, definir KPIs específico para cada etapa do funil de conversão;
. Para ser mais preciso na questão do tempo de resposta, mapear a jornada de consumo dos clientes, entender o lead time e o papel de cada mídia.
Não vai ser fácil, mas dá pra chegar lá! Outro dia, conversando com um amigo sobre esse tema, ele me perguntou qual seria o pior erro a ser cometido aqui. Além do óbvio que é se paralisar e não fazer nada pelo medo de errar, o maior erro seria querer acelerar o processo e pular etapas. Acompanhei de perto o caso de uma startup que migrou diretamente da performance pura para a TV aberta e a consequência disso é o desperdício de dois recursos que talvez sejam os mais importantes na construção de uma startup: tempo e dinheiro. Perdeu-se muito tempo corrigindo a rota, perdeu-se muito dinheiro com apostas equivocadas. Dá pra ser diferente!
Aulão.